Responsabilidade de administradores: panorama internacional
Casos recentes de corrupção e desastres ambientais levantam discussão sobre responsabilidade dos administradores
Petrobras e Vale reacenderam as discussões em torno da responsabilidade de administradores. A petroleira está envolta na Operação Lava Jato, que desde 2013 investiga o que se tornou o maior escândalo de corrupção da história recente do país. Já a mineradora voltou ao noticiário em janeiro. O rompimento de uma de suas barragens, em Brumadinho (MG), provocou mais de 200 mortes.
“Em regra geral, a responsabilidade é sempre da pessoa jurídica e não do diretor ou do conselheiro de administração”, tranquilizou Richard Blanchet, sócio sênior no Loeser, Blanchet e Hadad Advogados, durante evento que discutiu o panorama internacional em relação à responsabilidade de administradores, em março, no IBGC. A legislação brasileira, lembrou Blanchet, limita a responsabilidade do administrador de acordo com suas atribuições formais.
Para ilustrar a limitação da responsabilidade, Blanchet relata o procedimento padrão das investigações do Ministério Público (MP). No caso do conselho de administração, os procuradores verificam sua competência – determinada em legislação, estatutos, regimento e políticas internas da companhia. Levantadas as atribuições, o MP analisa as atas das reuniões do colegiado para verificar possíveis desvios de conduta, negligência ou omissão por parte dos conselheiros. A lei, enfatizou Blanchet, protege o administrador diligente e que tenha tomado decisões de maneira informada e sem conflito de interesses. Processos são possíveis em caso de dolo ou violação da lei.
A legislação previu mecanismos de proteção para o administrador pois, segundo Blanchet, punir de maneira generalizada inibiria o mercado. “É importante punir o mau administrador, mas também é extremamente importante salvar o bom”, afirma. Ao mesmo tempo, casos como Vale e Petrobras geraram mobilização da sociedade contra a impunidade. “Isso tudo impõe um novo padrão de conduta dos administradores. O conselheiro precisa ter absoluta consciência da grande responsabilidade do cargo”, alerta Blanchet.
A business judgment rule, princípio do direito americano que inspirou outras jurisdições, determina que as cortes julguem a maneira como os administradores procederam na condução da empresa, não no impacto dessas decisões. Os tribunais devem verificar se eles agiram de boa-fé e para o melhor interesse da companhia, se cumpriram seu dever de diligência e se as decisões não tiveram interesse pessoal. “A regra não protege decisões que envolvam fraude, ilegalidade ou que envolvam abuso de poder”, ressalta Isabel Franco, sócia de Koury Lopes Advogados. Ela recomenda que o conselheiro conheça as leis americanas, pois ele pode ser impactado caso sua companhia tenha ações negociadas nos Estados Unidos – além de Vale e Petrobras, empresas como Sadia também foram alvo de processos e pedidos de ressarcimento por parte de investidores americanos.
Na Inglaterra, é preciso preencher uma espécie de check-list de deveres dos administradores. Desde o ano passado, as companhias são obrigadas a informar em seus relatórios financeiros se o dirigente agiu dentro dos seus poderes, promoveu o sucesso da companhia, exerceu julgamento independente, agiu com cuidado e diligência, evitou conflitos de interesse, não aceitou benefícios de terceiros, e declarou interesse nas transações propostas para a companhia. “As normas de governança do Reino Unido recomendam que todos os diretores tenham treinamento sobre quais são os deveres gerais”, informa Ivan Martinelli, associado no CMS Cameron McKenna.
Na Alemanha, o conselho tem uma responsabilidade maior de supervisão. Maria Beatriz Kowalewski, sócia de TozziniFreire Advogados, explica que o duty of care (dever de cuidado) é muito mais rígido por lá. “Cabe ao conselho de administração rever efetivamente tudo”, afirma. Se houve erro da diretoria, o conselho, automaticamente, também está envolvido. “Cabe ao conselho de administração o ônus da prova, demonstrar que atuou com todo cuidado necessário na situação que está sendo investigada”, conta Maria Beatriz.