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Falta segurança jurídica nos acordos de leniência

Divergências entre CGU, AGU, TCU e Ministério Público geram dúvidas e incertezas nas empresas

Os acordos de leniência em processos de corrupção estão em vigor há quase cinco anos, mas ainda há muitas dúvidas e insegurança por parte das empresas na sua aplicação. Previsto na Lei Anticorrupção (Lei 12.856/13), o mecanismo permite que pessoas jurídicas que colaborarem nas investigações de atos contra a administração pública, nacional e estrangeira, ganhem benefícios na aplicação de multas e sanções nos processos. A falta de integração do chamado Sistema U (composto por Tribunal de Contas da União – TCU, Advocacia-Geral da União – AGU e Controladoria-Geral da União – CGU) cria insegurança jurídica nos acordos.


A lei anticorrupção estabeleceu que é de competência da CGU celebrar os acordos mas, no decorrer da vigência da lei, os outros integrantes do Sistema U e o Ministério Público se envolveram nas negociações com as empresas. “Existe uma disputa entre MP, TCU e CGU. Há problema de coordenação institucional”, afirma o advogado Valdir Simão, ex-ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, ex-ministro da CGU e sócio do Warde Advogados, durante o fórum de debates promovido pelo IBGC sobre o Sistema U e acordos de leniência, realizado no dia 24 de agosto, na sede do IBGC, em São Paulo.


Uma questão que preocupa é o surgimento de outros processos durante e após a negociação do acordo de leniência. A empresa pode estar conversando com a CGU e AGU, mas o Ministério Público ou o TCU entrarem com novas sanções ou ações contra a companhia. “Se há entendimento firmado com a administração pública, não é justo o Ministério Público entrar com uma ação de improbidade sem que esse acordo seja derrubado”, exemplifica Simão.


Outro ponto que causa preocupação é a atuação do TCU. O tribunal tem o poder de declarar uma companhia inidônea, o que veta a possibilidade de contratos públicos. “É a pena de morte para algumas empresas”, afirma Simão. A inidoneidade pode ser declarada a despeito de um acordo de leniência. Ainda não existe uma posição do TCU sobre essa questão.


Segundo Antônio Carlos Vasconcellos Nóbrega, corregedor-geral da União, o mecanismo de leniência vem amadurecendo ao longo do tempo e a colaboração do órgão com o Ministério Público é intensa. Desde novembro de 2016, a AGU participa dos acordos feitos pela CGU. “No caminho há pequenos retrocessos, mas avanços estão sendo feitos”, reconhece Nóbrega.


Samantha Chantal Dobrowolski, procuradora regional da República e coordenadora da comissão permanente de assessoramento em leniência e colaboração premiada do Ministério Público Federal, avalia que, depois da Lava Jato, que iniciou os trabalhos logo após a entrada em vigor da lei anticorrupção, houve um amadurecimento dos mecanismos previstos na lei e reafirma a colaboração entre os órgãos de controle. Entretanto, Samantha concorda que ainda falta resolver algumas divergências com o Tribunal de Contas da União (TCU). “O Estado tem que se organizar para dar segurança jurídica para o instrumento do acordo de leniência”, afirma Simão.


Dilemas

Com a entrada em vigor da lei anticorrupção e a eclosão da operação Java Jato aumentou significativamente a quantidade de empresas que estruturaram departamentos ou adotaram políticas de compliance. As companhias implantaram canais de denúncia e criaram ouvidorias. Entretanto, um dos questionamentos levantados durante o fórum do IBGC foi o que fazer com todas as denúncias que são apuradas internamente. Discutiu-se muito os procedimentos e responsabilidades quando são identificados atos ilícitos contra a administração pública.


De acordo com Nóbrega, mesmo que durante a investigação interna não sejam levantadas todas as evidências e não sejam cumpridos todos os requisitos para a empresa se beneficiar pelo acordo de leniência, a companhia deve fazer a delação. “As sanções podem ser mitigadas”, afirma o corregedor-geral da União.


Mas o que acontece quando a empresa identifica o ilícito e não comunica o poder público? “A empresa vai avaliar os riscos e assumir o ônus. Se ela se omitir, vai perder os benefícios de um eventual acordo”, alerta Samantha.


Simão relata casos nos quais conselheiros que votaram contra a revelação do ilícito para os órgãos de controle foram posteriormente responsabilizados. Essas irregularidades, que muitas vezes chegam por meio dos canais internos de denúncia e ouvidoria, não são necessariamente relacionadas a atos de corrupção. Crimes ambientais e outras infrações de menor impacto também se enquadram nessa situação. “Este é um dilema presente e que precisa estar no dia-a-dia das reuniões do conselho”, recomenda.

 

Benefícios dos acordos

A lei anticorrupção estabelece que para firmar um acordo de leniência é preciso que a empresa seja a primeira a se manifestar sobre a apuração do ato ilícito, cessar totalmente o envolvimento na infração e admitir a participação e cooperação plena nas investigações. Com o amadurecimento do mecanismo, os órgãos de controle são mais flexíveis em relação à necessidade da empresa ser a primeira a fazer a denúncia. Foi aberta a possibilidade para que outras companhias envolvidas em delitos já apurados também possam firmar acordos.


Como benefício, a empresa colaboradora tem redução de até dois terços do valor da multa administrativa (que poderia chegar a 20% do faturamento bruto), isenção da publicação da decisão condenatória e possibilidade de recebimento de empréstimos, subsídios e incentivos do poder público. A lei também prevê isenção ou atenuação da proibição de contratar com a administração pública. É neste ponto que está sendo questionada a atuação do TCU, na declaração de inidoneidade das empresas que fecharam acordo de leniência.


A existência de mecanismos de integridade é um atenuante na aplicação de sanções. Entretanto, a existência de processos de compliance não afasta totalmente a aplicação da multa, mas pode representar valores e penalidades menores.


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