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Sustentabilidade deve mostrar resultados financeiros

Maior desafio é mudança na cultura organizacional para adoção de visão sistêmica de impactos as atividades do negócio em toda sociedade

Um dos maiores desafios da sustentabilidade é mostrar seus resultados em ganhos financeiros. Sem essa monetização, projetos de caráter socioambiental acabam não sendo valorizados e seus benefícios subestimados nas companhias. Porém, empresas têm adotado indicadores para medir o impacto de ações de sustentabilidade e impondo metas socioambientais para seus executivos, o que indica mudança na cultura organizacional. “Sustentabilidade não é filantropia, é eixo do negócio. Temos indicadores que mostram que ganhamos muito dinheiro com a sustentabilidade”, afirma Marcelo Castelli, CEO da Fibria, um dos participantes do fórum de liderança consciente, cultura organizacional e sustentabilidade realizado no dia 2 de agosto, na sede do IBGC, em São Paulo.


Castelli contou um caso no qual os resultados financeiros foram muito claros. A companhia enfrentava problema de furto de madeira, que envolvia crime organizado, desmatamento de mata nativa e comunidades acuadas pela violência. A comissão de sustentabilidade se debruçou sobre o tema e trouxe um novo olhar sobre o problema e sugeriu projetos inclusivos de cunho social.


Em paralelo às ações de repressão pelas autoridades, a empresa adotou ações para aproximação das comunidades e iniciativas de geração de emprego e renda, como produção de mudas florestais. De acordo com dados do relatório sustentabilidade da empresa de 2012, com a implantação do projeto, em apenas um ano houve redução de 87% no furto de madeira – o que acarretou numa diminuição do prejuízo de mais de R$ 12 milhões em 2011, para cerca de R$1,8 milhão, em 2012. “Foi o investimento com melhor retorno que companhia teve nos últimos tempos”, conta Castelli.

Visão sistêmica

Para se tornar um princípio que traga retornos financeiros consistentes, a sustentabilidade exige uma mudança de visão das lideranças sobre o papel da empresa dentro da sociedade. As atividades da companhia têm impacto social e mudanças de comportamento e de valores da sociedade também influenciam os negócios. A Fibria adotou essa abordagem sistêmica para analisar um problema que, a princípio, era de segurança patrimonial. A comissão de sustentabilidade percebeu que o furto de madeira era uma questão muito mais ampla e fatores sociais e econômicas influenciavam a situação.


A visão sistêmica possibilita uma avaliação mais ampla dos riscos para o negócio. A consciência do impacto das atividades da companhia na sociedade permite criação de cenários mais detalhados e diagnósticos mais precisos sobre possíveis problemas e, também, de oportunidades, como mostrou o caso do furto de madeira.


Castelli afirma que essa visão sistêmica e a percepção da interdependência da empresa com toda a sociedade muda a visão do negócio para o longo prazo. “O líder consciente é aquele que tem condições de olhar o todo, entender o papel da empresa dentro da dinâmica e interação com sistemas maiores, o mercado e a sociedade como um todo”, diz Ricardo Young, presidente do conselho deliberativo do Instituto Ethos.

Cultura e metas

Demonstrar os resultados financeiros ajuda a enfrentar a principal dificuldade da sustentabilidade nas empresas, que é a mudança na cultura organizacional. Lideranças tradicionais trabalham com uma visão linear, focando a gestão em resultados, metas e controles, normalmente, de curto prazo. De acordo com Young, somente com uma visão sistêmica é possível compreender o conceito de sustentabilidade, que é a perenidade do efeito das ações do presente no futuro. “Aquilo que não tem a semente do futuro não é sustentável”, resume.


“As lideranças são fundamentais nesse processo de mudança na cultura, mas muitas não têm a compreensão sistêmica”, afirma Cristiana Heluy, assessora de comunicação e sustentabilidade da Algar Telecom. A transformação da cultura organizacional é lenta e passa por diferentes etapas, relata Cristiana.


Na Algar Telecom, no primeiro momento, foi preciso trabalhar, de forma individualizada, a formação e o entendimento de sustentabilidade pela liderança. Segundo Cristiana, nessa etapa de treinamento e engajamento foram estabelecidas metas ligadas à sustentabilidade que impactavam a remuneração variável dos executivos. “Fizemos isso para garantir o alinhamento da liderança com a cultura de sustentabilidade”, conta Cristiana. Atualmente, metas são incluídas em projetos de acordo com sua prioridade ou impacto.


A visão sistêmica foi sendo incorporada pelas lideranças da Algar Telecom aos poucos e sustentabilidade já não é vista como responsabilidade de um único departamento, mas ela se consolidou como uma preocupação de toda a companhia, de acordo com Cristiana. “Sustentabilidade não é vista apenas como algo aspiracional ou bonito, mas um princípio que traz resultados”, avalia.

Alta liderança

“Rever modelo de negócio e a cultura organizacional e inserir a sustentabilidade como parte do negócio é um desafio”, diz Gabriela Baumgart, diretora executiva e acionista do Grupo Baumgart e conselheira independente de empresas. O conselho é importante nesse processo de transformação da cultura, trazendo o pensamento sistêmico e o olhar da sustentabilidade para o planejamento estratégico. “Somos de uma geração com um mindset linear, não sistêmico. Estamos em um processo doloroso de aprendizado, mas é um desafio bom em que temos que nos provocar o tempo inteiro”, relata.


“O papel do conselho não é olhar o último relatório trimestral e verificar se as metas foram alcançadas. Esses e outros procedimentos são importantes, mas são a rotina. Isso não é a empresa”, afirma Ricardo Young. O desafio é verificar se o conselho está atuando a partir de uma visão consciente. “É preciso exigir que a companhia compreenda o mundo e possa perceber a interdependência e relação com todos da sociedade”, diz.


Marcelo Castelli relata que o diálogo do CEO com o conselho deve se basear em uma visão de longo prazo, perceber que os resultados do curto prazo são consequência de uma jornada mais longa e consistente. “A cultura organizacional e essa visão de longo prazo tem que ser item de pensamento contínuo do conselho. O conselho precisa ter certeza que o management está indo na direção correta, estimulando e dando feedback para a gestão”, afirma o CEO da Fibria.

 

Evento conjunto das comissões de sustentabilidade e de pessoas

O fórum de liderança consciente, cultura organizacional e sustentabilidade é resultado da iniciativa conjunta das comissões de sustentabilidade e de pessoas do IBGC. “Percebemos que o grande desafio das empresas no mundo atual é trazer a sustentabilidade, efetivamente, para dentro das empresas. Queremos apresentar o contexto que leva a liderança a pensar em estratégias mais sustentáveis aos negócios”, afirma Álvaro Almeida, membro da comissão de sustentabilidade e um dos organizadores do fórum.


As duas comissões reunirão os principais pontos discutidos durante o evento para produzir um documento destacando as ideias mais relevantes abordadas. O material ajudará na disseminação das ideias apresentadas. O foco da divulgação serão diretores e executivos das companhias, que respondem pelas estratégias desenvolvidas pelo conselho. A liderança mais consciente induz a cultura de sustentabilidade como um tema transversal em todo o negócio, avalia Almeida. A intenção do documento é provocar a liderança para uma postura mais consciente dos desafios e da necessidade de construção de uma nova cultura organizacional.


A governança é um dos aspectos ressaltados pelas comissões. “Uma estrutura de governança permite melhores decisões, estabelecimento de metas, mensuração de resultados e políticas que seguem determinados princípios. Com esses princípios, a organização tem maior possibilidade de perdurar no tempo. Não é possível dissociar a governança do negócio sustentável”, afirma Almeida.




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