Artigo: "Por mais e melhores comitês de auditoria"
A atuação do comitê de auditoria, órgão de assessoramento e apoio ao conselho de administração, vem ganhando cada vez mais visibilidade e relevância na estrutura de governança das empresas e organizações brasileiras. Seu papel inclui apoiar o conselho no monitoramento da qualidade das demonstrações financeiras e dos controles internos e na avaliação e acompanhamento de questões relativas à conformidade, à integridade e ao gerenciamento de riscos da organização.
Dados levantados pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)[1] indicam que a presença de comitês de auditoria (ou de comitês dedicados a esse tema) nas empresas listadas em bolsa cresceu de 14,3% em 2005 para 31,9% em 2015. Esse crescimento também é corroborado por números encontrados em estudos conduzidos por outras organizações.
Mas apesar desse recente boom em nosso mercado, a importância do comitê de auditoria não é novidade. Internacionalmente, já em 1939, a bolsa de Nova Iorque passou a incluir em suas regras a recomendação para que as empresas criassem “um comitê especial do conselho de administração, composto por conselheiros externos ou independentes [non-executive directors]”, responsável pela seleção dos auditores independentes. Em 1992, o Cadbury Report, considerado o primeiro código de boas práticas de governança do mundo, foi apresentado ao mercado já com a recomendação que todas as empresas possuíssem um comitê de auditoria. Em 2005, como resposta aos escândalos contábeis nos Estados Unidos, a aprovação da Lei Sarbanes-Oxley talvez tenha sido o maior impulso à popularização dos comitês de auditoria, não só naquele país, mas também em empresas com ações negociadas no mercado americano e em subsidiárias em outros países.
No Brasil, desde a primeira edição de seu Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa, em 1999, o IBGC recomenda a instituição do comitê de auditoria pelas empresas. Banco Central e Susep instituíram, em 2004, a obrigatoriedade do órgão para instituições financeiras, entidades seguradoras, de capitalização e de previdência. Já em 2009, o IBGC publicou um documento exclusivamente dedicado a trazer recomendações que contribuíssem para um melhor e mais efetivo funcionamento dos comitês de auditoria, o Guia de Orientação para Melhores Práticas de Comitês de Auditoria.
Mais recentemente, muitas das alterações no regramento vigente no país ocorridas na última década, em especial naqueles direcionados às empresas de capital aberto, públicas e sociedades de economia mista, reforçam a importância e até mesmo criam a obrigatoriedade da instalação do comitê de auditoria para essas organizações: Instrução CVM 509 (2011), Lei das Estatais (2016), Código Brasileiro de Governança Corporativa Companhias Abertas (2016), Instrução CVM 586 e o novo regulamento do Novo Mercado (2017) são alguns exemplos.
Mas a simples instituição de um comitê de auditoria não basta para garantir que os seus benefícios sejam percebidos e capturados pelas organizações. Exemplo disso é que algumas das empresas recentemente envolvidas em crises éticas e escândalos corporativos possuíam, ao menos no papel, esse órgão formalmente estabelecido.
Para se beneficiar verdadeiramente da atuação do comitê de auditoria é necessário garantir eficiência e eficácia ao órgão, o que passa por discutir e definir adequadamente seu papel e responsabilidades, composição, independência, agenda e dinâmica de trabalho, além de zelar para que seu relacionamento com os demais agentes de governança (sócios, conselho, executivos, auditorias interna e independente e conselho fiscal) ocorram de maneira apropriada, produtiva e que permita a adequada atuação do comitê.
Preocupados em contribuir para o aprimoramento dos comitês de auditoria no país, o IBGC e o IBRACON (Instituto dos Auditores Independentes do Brasil) lançaram no último dia 2 de outubro, durante o 18º Congresso IBGC, a publicação “Orientações sobre Comitês de Auditoria: Melhores Práticas no Assessoramento ao Conselho de Administração”. A publicação, fruto dos esforços conjuntos das duas instituições, traz recomendações úteis tanto para organizações que estejam instituindo um comitê de auditoria como para aquelas que já possuem esse órgão, mas que buscam aprimorar o seu funcionamento.
Mudanças que fomentem a criação de comitês de auditoria são muito bem-vindas em nosso mercado, mas precisam ser acompanhadas pela conscientização de administradores e demais stakeholders de que cumprir as regras não basta. É preciso buscar efetivamente construir um órgão capaz de criar valor para a organização.
Não bastam apenas mais comitês de auditoria. É preciso também que sejam melhores.
* Alberto Whitaker : conselheiro de administração do IBGC
Luiz Martha: gerente de Pesquisa e Conteúdo do IBGC
[1] Estudos “Evolução da Governança Corporativa nas Empresas Listadas em Bolsa (2004 – 2012)”, de 2014 e “Perfil dos Conselhos de Administração”, de 2016.