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“Se não houver comprometimento da administração, a estrutura de compliance será ineficaz”, alerta Sh

Convidada como uma das instrutoras da 2ª turma do Curso de Compliance e Governança do IBGC, realizado em junho deste ano, a advogada Shin Jae Kim concedeu entrevista para a IBGC em Foco. Com mais de 25 anos de experiência em operações de fusões e aquisições e vendas de empresas, Shin é sócia da TozziniFreire Advogados e head da área de Compliance e Investigação do escritório.

Confira a entrevista abaixo:

IBGC em Foco: Atualmente, muito se discute sobre a necessidade de as empresas terem estruturas de compliance. Mas, na sua opinião, as organizações brasileiras estão culturalmente preparadas para recebe-las?

Shin: Acredito que estamos em processo de mudança. Participo de várias reuniões com conselheiros, diretores e gerentes para tratar de temas relacionados a compliance e é nítida a crescente conscientização de que certos riscos, como a corrupção, é um risco concreto que precisa ser enfrentado. Não seria diferente considerando as notícias diárias de escândalos de corrupção com envolvimento de executivos de grandes empresas nacionais. Por outro lado, este reconhecimento é um passo importante para que a administração de empresas decida por clareza e transparência na condução de seus negócios e, logo em seguida ou concomitantemente, por implantar mecanismos de prevenção de forma a mitigar os riscos inerentes a seus negócios, que podem resultar em responsabilidades pessoais dos administradores, perdas financeiras e dano à reputação das empresas. Este processo está ocorrendo em muitas organizações com sucesso. Por isso, acredito que as organizações brasileiras estejam prontas para implantação de programas de compliance. Importante registrar, no entanto, é que se não houver comprometimento da administração nesta implantação, a estrutura de compliance será ineficaz e até um mal investimento.

IBGC em Foco: Os administradores brasileiros estão engajados em preparar as suas organizações para criar um ambiente ético, bem como instalarem programas de integridade?

Shin: De modo geral, os administradores brasileiros já enxergam a importância do compliance dentro de uma organização em razão, principalmente, das graves consequências tanto financeiras quanto reputacionais que as empresas envolvidas nos recentes escândalos de corrupção vêm enfrentando.

A “Pesquisa TozziniFreire - Perspectivas para o ambiente jurídico e econômico brasileiro em 2016”, realizada em parceria com a revista Latin Finance e a consultoria europeia Management & Excellence (M&E) e apoio da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), corrobora a importância dada ao compliance ao constatar o seguinte: "enquanto a primeira edição da pesquisa mostrou que 91% dos entrevistados pretendiam adotar programas de compliance, a segunda versão indicou que a atenção ao tema é unanimidade entre os entrevistados". Assim, notamos que muitos administradores estão comprometidos e engajados na implementação de programas de compliance em suas empresas. Estudos mostram que tal engajamento é fundamental para a criação de uma cultura de ética, pois, além do fato de que os administradores são exemplos de conduta para os funcionários, são eles que devem liderar esse processo de conscientização, juntamente com a média gerência, incentivando e difundindo uma cultura de ética na empresa.

IBGC em Foco: As estruturas de compliance necessitam de informações e o engajamento de áreas importantes das empresas. Hoje, o compliance officer nas organizações brasileiras ainda sofre com a departamentalização das empresas?

Shin: De fato, a departamentalização das empresas representa um desafio para o compliance officer na implementação e manutenção do programa de compliance. Para que o programa se torne eficaz, é necessária a adesão de todos os funcionários, bem como uma comunicação efetiva entre os diversos departamentos da empresa, inclusive através de canais de comunicação internos que devem ser amplamente divulgados e acessíveis a todos.

Nesse sentido, o compliance officer precisa estabelecer uma interação e comunicação efetiva, principalmente, com departamentos-chave dentro da organização tais como: auditoria interna, controles internos, jurídico, gestão de riscos e recursos humanos.

Para propor uma estrutura que garanta a comunicação efetiva, o compliance officer precisa levar em consideração o porte e as especificidades da empresa, bem como entender muito bem a organização. Seguindo as melhores práticas, muitas empresas têm criado comitê de ética ou comitê de compliance exercendo um importante papel na comunicação efetiva do programa de compliance em razão, principalmente, de sua composição multidisciplinar formada, geralmente, pelo compliance officer e por executivos de departamentos chave da empresa. Tal comitê serve ainda como órgão colegiado para apuração das violações e imposição das medidas disciplinares cabíveis.

IBGC em Foco: Qual é o “calcanhar de Aquiles” das organizações brasileiras hoje em termos de ética e conduta?

Shin: No âmbito de implementação de programas de compliance, as empresas estão dedicando especial atenção aos controles internos de modo a enfrentar os riscos aos quais estão expostas, assim como fornecer uma segurança razoável para o desempenho de suas atividades. No entanto, a preocupação maior se refere ao incontrolável, ou seja, à atuação dos terceiros, pois eles representam os interesses das empresas e podem gerar responsabilização por práticas de corrupção, além de possíveis danos reputacionais.

Importante ressaltar que a grande maioria dos casos de corrupção envolve a atuação de terceiros. Assim, é imprescindível a realização de um procedimento específico para a verificação prévia à contração de terceiros (due diligence de terceiros) a fim de mitigar eventuais riscos e selecionar somente os terceiros que estejam de acordo com os princípios e valores da empresa.

IBGC em Foco: Quais são os grandes desafios dos profissionais de compliance nas empresas brasileiras? Esses desafios estariam no topo da pirâmide corporativa ou entre os colaboradores?

Shin: Além da questão cultural, outro grande desafio para os compliance officers refere-se aos recursos, a autonomia da área de compliance. Nesse sentido, é importante que a área de compliance tenha autonomia e os devidos recursos necessários para o desempenho de suas funções. Referida autonomia refere-se à capacidade para tomada de decisões e adoção de medidas necessárias, além do acesso direto à alta administração da empresa.

IBGC em Foco: Quanto à Lei Anticorrupção, ela está compatível com a realidade brasileira?

Shin: A Lei Anticorrupção está em linha com um movimento internacional de punir, não somente os indivíduos envolvidos em atos de corrupção, mas também as empresas para as quais os tais indivíduos estão sujeitos. Isto porque, entende-se que na maioria dos casos elas são beneficiárias dos resultados decorrentes da corrupção. No Brasil, a corrupção sempre foi considerada crime e a responsabilidade criminal recai nos indivíduos que cometeram o ato de corrupção.

Na minha opinião, ao dar possibilidade de redução de pena pecuniária, como incentivo, a existência de programa de compliance efetivo (que na lei é tratada como programa de integridade) a Lei Anticorrupção fica compatível com a realidade brasileira, já que os ilícitos estabelecidos pela Lei são riscos que não podem ser ignorados pelas empresas que atuam no Brasil.

IBGC em Foco: Mesmo com a nossa lei, ainda precisamos nos respaldar em legislações estrangeiras como UK Bribery Act e a FCPA?

Shin: Sim, as empresas precisam se respaldar nas leis anticorrupção internacionais por dois motivos: pelo efeito extraterritorial de tais leis e pelo fato de que a Lei Anticorrupção brasileira, de modo similar às leis internacionais, prevê o programa de compliance como um fator mitigador na aplicação das sanções pelas autoridades. Ademais, é importante nos respaldarmos nas leis anticorrupção internacionais pelo fato de que tais leis, principalmente o FCPA, encontram-se em estágios bem mais avançados no que se refere à enforcement e, portanto, podem servir como importante orientação para as empresas.

No entanto, tal preocupação deve ser consideravelmente maior para as empresas que possuam valores mobiliários negociados nas bolsas norte-americanas ou que fazem negócios nos EUA ou Reino Unido.

IBGC em Foco: Você acredita que estamos entrando na era da “empresa limpa”? Por quê?

Shin: Acredito que estamos entrando na era da empresa limpa e que se trata de um caminho sem volta. A nova realidade brasileira apresenta um cenário propício para o atual movimento das empresas na adoção de mecanismos e procedimentos de integridade. O programa de compliance se for bem gerido irá trazer, dentre outros, vantagens competitivas e melhoria nos controles internos da empresa. Ainda, como dito anteriormente, a adoção de programas de compliance poderá servir tanto como fator mitigador das sanções, como um elemento na propositura de acordos de leniência que neste último caso será obrigatório para a empresa.


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