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Simon Logstaff: “Na ética, não basta ser uma ‘boa pessoa’, deve-se tomar decisões conscientes”


Neste momento em que o Brasil ganha destaque internacional devido ao andamento da Operação Lava Jato, tida como a maior investigação sobre corrupção realizada até hoje em território brasileiro, o debate sobre ética foi reacendido no mundo corporativo. E, com o propósito de munir os administradores de informações e disseminar as boas práticas de governança “tone at the top”, o 4º Encontro de Conselheiros do IBGC terá como tema “Conselho: Ética, Inovação e Liderança”.

Com o propósito de desmistificar o que seriam comportamentos éticos e deixar claras as responsabilidades dos administradores, o evento receberá como painelista Simon Longstaff, diretor executivo do The Ethics Centre, da Austrália. Nomeado um dos AFR Boss True Leaders do século XXI, Longstaff é filósofo e tem sua carreira conectada à disseminação de princípios éticos e governança corporativa.

“Tive o imenso prazer de conviver com Longstaff no conselho de administração do GRI. Ele navega em grande pluralidade de temas, com uma incrível capacidade de liga-los ao tema central: ética e sua incorporação no mundo empresarial”, comentou Roberto Waack, membro do Colegiado de Apoio ao Conselho Governança e Indicação do IBGC e fundador da Amata S.A..

Segundo Waack, a vinda do especialista é uma oportunidade única para que o público brasileiro debata sobre os temas integridade, corrupção, externalidades, transparência e governança, que estão em alta no cenário de crise atual. “A ampliação do escopo de governança é urgente diante dos desafios que se apresentam e o repertório do filósofo permite estabelecer conexões evidentes entre a responsabilidade corporativa e suas relações com os órgãos reguladores, investidores, seguradoras e sociedade civil”, destacou.

Já para Adriane de Almeida, superintendente de conhecimento do IBGC, o debate sobre ética aprofundará o nível de conscientização sobre temas ainda negligenciados por boa parcela das empresas brasileiras. “É uma necessidade falar sobre a efetividade do conselho de administração na condução dos negócios; o padrão ético exigido do conselheiro; e confiança dos acionistas e stakeholders quanto a gestão de seus negócios pelo board”, exemplificou.

Mas, afinal, o que é ética?

Em entrevista exclusiva à IBGC em Foco, Simon Longstaff abordou os principais conceitos disseminados por meio de seu trabalho no The Ethics Centre. Confira a seguir:

IBGC: O que é ética? Como posso saber se sou um cidadão ético? Longstaff: A ética começa com uma questão prática: “O que eu deveria fazer?”. Como respondemos a esta pergunta molda as decisões que tomamos e, portanto, o mundo que ajudamos a construir. Em sua essência, a ética é “a arte de fazer”. Na ética não basta ser uma “boa pessoa” apenas por uma questão de hábito, deve-se tomar decisões conscientes – isto é, atuar com uma certa “presença de espírito”. Uma vida com propósitos, ou uma organização com propósitos, é formada por um conjunto de valores e princípios fundamentais. Valores ajudam a escolher entre opções que levam a um bom fim e princípios ajudam a regular os meios pelos quais alcançamos nossos objetivos. Assim, para se reconhecer como um cidadão ético é necessário ter certeza de que você tem um propósito definido (sua concepção sobre o que você faz para construir uma boa sociedade) e um conjunto alinhado de valores e princípios os quais você conscientemente segue para fazer escolhas e agir com ética, na prática.

IBGC: Por que é tão difícil para as companhias fazerem com que seus funcionários sigam as regras? Longstaff: Embora as organizações e sociedades precisem de um mínimo de regras e regulações para manter a ordem e a conduta coerente, o excesso de confiança nesses mecanismos pode não ser produtivo. Por exemplo, organizações que depositam sua confiança inteiramente na regulação interna e vigilância podem destruir a capacidade dos indivíduos de tomar decisões responsáveis. Isso ocorre porque a cultura em que é impossível escolher fazer o errado é igual a cultura em que é impossível fazer o certo. Sem a prática de fazer escolhas, a habilidade em escolher é perdida. De modo generalista, as regras devem ser construídas em um quadro claro de valores e princípios, apenas desta forma as regras têm legitimidade. Sem uma base sólida de ética, as regras podem parecer arbitrárias e até mesmo injustas. Isso faz com que as pessoas relutem em seguir regras que são aplicadas de forma seletiva. Os funcionários só podem aplicar as regras se elas forem justas e razoáveis, aplicadas por líderes e que não sejam muito complexas.

IBGC: Como é possível encorajar comportamentos éticos nos negócios? Longstaff: A melhor maneira de encorajar comportamentos éticos nos negócios é exigir que as empresas sejam claras no seu propósito, valores e princípios (sua estrutura ética) e depois avaliar se o que é dito é realmente feito. Na prática, isso deve estar alinhado. Não é uma questão de medir percepções, é sobre como garantir que os sistemas, políticas e procedimentos estejam alinhados com os princípios éticos. Por fim, os conselhos de administração das empresas precisam estar envolvidos com questões que afetam a cultura da organização – e precisam estar cientes do papel que desempenham nesta área vital da governança corporativa.

IBGC: Como os líderes de uma organização podem influenciar seus colegas a ter um comportamento ético? Longstaff: Conselheiros e executivos precisam ser um bom exemplo de conduta pessoal. Eles também precisam estar atentos aos princípios éticos da organização e à cultura organizacional para mostrar que são importantes para eles. É importante também que os executivos falem de forma explícita sobre a dimensão ética da governança, garantindo que tomam decisões em nome da empresa com base em princípios éticos. Por fim, é essencial que os líderes da companhia avaliem e implementem políticas e procedimentos para evitar condutas antiéticas. Deve-se desencorajar condutas antiéticas em prol do desempenho. Com isso, o papel dos líderes pode ser reforçado com a criação de uma cultura em que os funcionários sejam recompensados por alertar sobre alguma inconsistência.

Percepções de hipocrisia entre a liderança de uma empresa podem facilmente destruir a integridade de uma empresa - e a boa inteligência "do chão de fábrica" ​​é uma poderosa proteção contra esse risco.


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